Crónica de luto e amor: Jorge Pessoa e Silva reflete sobre Diogo Jota, o vazio e a força de seguir em frente
No momento mais sombrio da dor, quando o ruído dá lugar a um silêncio ensurdecedor, Jorge Pessoa e Silva, na sua crónica semanal do Livro do Desassossego, dá-nos palavras de espelho e abrigo, diante da perda de Diogo Jota e do irmão André Silva. O texto, tocante e honesto, oferece não apenas consolo, mas também humanidade — e até esperança — num tempo de absoluto vazio.
Com sensibilidade, o autor descreve o luto como um caminho que se inicia depois de todos os abraços, manchetes e flores — um processo interno, solitário e invisível. E lembra que a dor é menos difícil do que o vazio, esse espaço sem barulho, onde só resta o tempo a ensinar a reorganizar a vida.
Luis Enrique e a pergunta que muda tudo
O ponto mais forte da crónica surge com o exemplo de Luis Enrique, treinador do Paris Saint-Germain, que perdeu a filha Xana, de apenas nove anos, em 2019. Ao deixar palavras de condolências à família de Diogo e André, o técnico espanhol partilhou um exercício que o ajudou a lidar com o luto: perguntar-se “se a minha filha está a ver-me, o que pensará da forma como estou a viver a sua partida?”
A resposta — que muitos pais dariam da mesma forma — é um convite à reconstrução, ao perdão e à transformação da dor num ato contínuo de amor.
Pessoa e Silva reforça que, tal como Enrique, a família de Diogo Jota poderá reencontrar sentido através dos filhos que ficaram. Dinis, Duarte e Mafalda serão, como descreve o cronista, milagres diários, capazes de puxar os avós e a mãe, Rute Cardoso, para um novo amanhecer, mesmo que cheio de cicatrizes.
Diogo: um homem de brisa, não de ventania
O autor faz ainda um retrato discreto, mas poderoso de Diogo Jota: um homem que, mesmo longe dos holofotes, deixava um perfume de empatia por onde passava. “Brisa, não ventania”, define — alguém que fazia bem sem anunciar. E por isso, as homenagens surgiram de todo o mundo, de todas as cores, de todas as vozes.
Silêncio, julgamentos e o valor do presente
Por fim, o autor recusa entrar em discussões como a da ausência de Cristiano Ronaldo no funeral. Aponta — com razão — que ninguém tem o direito de julgar a forma como outro lida com a dor. Cada um vive a perda ao seu ritmo, na sua verdade.
E encerra a crónica com dois princípios simples, mas cheios de propósito:
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Ser a melhor pessoa possível — porque espalhar felicidade é a única coisa que vale a pena;
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Valorizar o que se tem — porque o “hoje” é tudo o que realmente existe.
Neste mundo apressado e barulhento, esta crónica é uma pausa necessária. Um texto que convida à empatia, à reflexão e à vida — mesmo quando ela parece suspensa.